(Leia Antes: Prólogo, Capítulos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7)
Você faz um belo trabalho e eu não gostaria de vê-la morta...
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Os policiais ignoram a campainha e batem na porta.
Depois de uma rápida averiguada pelo olho mágico e com um cigarro entre os dedos, Lídia os recebe no apartamento de Roberto.
– Bom dia. Foi daqui que partiu a ocorrência? – diz o cabo Dante, de acordo com a identificação no uniforme, um homem negro, alto e de corpo atlético.
– S-sim, é daqui mesmo – responde Lídia em voz baixa, entre uma tragada e outra, ainda meio insegura sobre o que está fazendo. Leva o dedo indicador à frente da boca, num sinal que solicita silêncio aos policiais.
Acompanhado do soldado Da Matta, um jovem de cabeça raspada e espinhas no rosto, o cabo Dante entra na sala, caminhando astutamente com uma arma apontada para o chão.
Dante e Da Matta dão uma pequena vasculhada visual pela sala e Lídia faz um sinal para eles, guiando-os à distância, apontando para o corredor e, em seguida, para a porta do escritório.
Os policiais agem como grandes predadores procurando a sua presa, checando o corredor, sempre alternando as suas posições, um dando cobertura ao outro.
Chegando à porta do escritório de Roberto, Dante olha para Lídia, que confirma silenciosamente com a cabeça a prisão do ex-namorado.
– Ele está armado? – sussurra o cabo.
– Não – responde Lídia, prontamente. – Ele detesta armas. Acho que não tem perigo algum. Ainda deve estar desmaiado. – conclui, entregando as chaves a Da Matta.
O cabo dirige para o soldado um olhar que ele parece conhecer. Recebida a ordem silenciosa, Da Matta coloca cuidadosamente a chave na porta, tentando fazer o mínimo barulho possível.
Depois de girar a chave silenciosamente, Da Matta termina de destrancar a porta e Dante torce a maçaneta com cautela.
Abruptamente, Dante abre a porta e Da Matta entra, apontando a arma para o lado direito do quarto. Menos de dois segundos depois, Dante entra, cobrindo o lado esquerdo. Ambos gritam palavras de ordem, mas o fazem para uma sala vazia, que não abriga armários ou nenhum lugar onde um rapaz levemente acima do peso para a sua estatura poderia se esconder.
– Cadê ele? – pergunta Lídia, sem entender nada.
A sala desorganizada mostra que ele havia acordado e que teve tempo para arquitetar sua fuga. Para Lídia, aquela sala vazia tem um significado maior: a sua vida ainda corre perigo, como comprova o monitor do computador de Roberto, com a seguinte mensagem em sua tela negra:
Te encontro no fim da lista, lilitop.
Naquele mesmo momento, Ingrid está em casa, acessando o seu e-mail. Ela preenche a área destinada ao usuário e, em seguida, à senha.
Seus finos dedos digitam com a pressa de costume o nome do correio eletrônico, mas um descuido lhe faz errar a senha.
– Droga! – resmunga a descendente de japoneses.
Ela volta à tela inicial e preenche novamente os dados com atenção redobrada.
Ingrid aguarda pacientemente a barra chegar de 0 a 80%. O computador velho, fruto do escritório do seu pai, faz tudo parecer mais difícil, mas ela gosta. Até a impressora matricial tem seu charme, fazendo sons irritantes cada vez que precisa imprimir algum texto. O seu pai reclama. Ela adora.
De repente, Ingrid ouve passos. Com certeza é Nayumi Misamoto, sua mãe, querendo saber se ela está preparada para a entrevista de emprego. Ela não pode vê-la na internet.
A forma mais clara de descrever Nayumi é como o original envelhecido, porém conservado, de onde sua filha foi copiada. Ela ainda não tem fios brancos em sua cabeleira delgada e em seu rosto mora o segredo indecifrável da longevidade japonesa.
– Ingrid! – diz a mãe, num tom imperativo, do corredor que leva ao quarto da filha. – Já está pronta?
– Vou tomar banho agora, mã! – responde Ingrid, desligando o monitor.
Nayumi entra no quarto e encontra a filha de pé, de frente para ela, tapando a luz piloto do computador.
– Você estava na internet? – pergunta a mãe, desconfiada. – Você sabe que só pode mexer com computador depois que arrumar um emprego, como o seu pai disse, né?
– Claro, mã! – diz a garota com um sorriso angelical. – Agora, dá licença que eu preciso me preparar para entrevista, tá?
– Tudo bem! – conclui a mãe, dando-lhe as costas e saindo do quarto. – Mas ande depressa ou vai se atrasar!
Com o assunto encerrado, Ingrid respira aliviada. Então liga o monitor e vê uma lista de doze mensagens, entre as quais se encontram e-mails de frequentadores de seu blog, um ou outro spam de produtos ou serviços e, finalmente, da desconhecida que postou uma mensagem em seu blog, Bruna.
O e-mail trazia em sua linha Assunto a mensagem “Gostei do seu Blog!”.
Contente por achar que conquistou mais uma admiradora, “Uma garota finalmente!”, não hesita em querer ler seu conteúdo.
A demora maior que a habitual para carregar o e-mail deixa Ingrid nervosa, ora movendo o cursor do mouse para direita e para esquerda, ora fazendo círculos, para constatar se o computador não havia travado, uma plausível explicação para a demora.
Finalmente, a mensagem aparece.
Olá, Ingrid.gatinh@!
Como eu te disse, gostei muito de seu blog. É divertido, moderno, bem ilustrado, em suma, é uma gracinha.
Gostaria muito de vê-lo atualizado por muito tempo e lhe dou uma chance de você continuar em condições de fazer isso.
Mande esta mensagem para sete pessoas. Não me faça perguntas, apenas faça o que eu lhe pedi.
Você faz um belo trabalho e eu não gostaria de vê-la morta...
Ass.: Bruna.
Apesar das raízes japonesas, o ato instantâneo de Ingrid foi o de se benzer. Ficou estremecida com o que leu, pois do canto particular e positivo de seu blog achava que poderia vir de tudo, menos uma ameaça de morte.
Supersticiosa, Ingrid clica no botão “Encaminhar” da barra de ferramentas de sua caixa postal e começa a escolher sete endereços para enviar a funesta mensagem. Seus dedos suados escorregam no teclado, seu coração acelerado já se recobrou do susto inicial, mas ela sente que precisa passar aquela corrente para frente o quanto antes.
Olhando para os sete endereços eletrônicos escolhidos, Ingrid prepara-se para apertar o botão “Enviar”.
Três batidas na madeira, uma mexida na maçaneta e Alexandro aparece sem cerimônias no quarto da filha. Ela mal tem tempo de desligar o monitor antes que ele perceba.
– Não vai tomar banho? Eu só posso te dar carona se você se arrumar rapidinho! – reclama o pai da garota, apressado.
Antes que seu pai desconfiasse, Ingrid pega uma toalha e parte para o banheiro, sob o olhar fulminante de Alexandro.
Ingrid entra no chuveiro, ensaiando mentalmente as respostas que dará para cada pergunta que possa vir do seu entrevistador, vez ou outra deixando um “com certeza, senhor”, como se concordasse com o chefe imaginário.
Talvez estivesse tão entretida com o banho e a entrevista mental que não percebeu a sombra se aproximando da cortina do banheiro.
Enquanto a jovem estava de olhos fechados e com o rosto mergulhado no jato do chuveiro quente, a sombra se aproxima cada vez mais.
A cortina se abre, uma mão está levantada. Algo corta o ar com uma velocidade e só para quando encontra a pele de Ingrid.
A garota grita inicialmente de susto, por ser interrompida no banho. Imediatamente sente no corpo as marcas do invasor. A pele machuca e queima, mas não consegue evitar mais um golpe. A ferida em forma de tira no braço não deixa dúvidas.
É o cinto do seu pai.
– Eu já não te falei que não quero você na internet? – grita Alexandro, finalizando com uma terceira lambada de cinto nas costas da filha. – Vai aprender agora, vai? – Alexandro sai ofegante e molhado, deixando a filha chorando debaixo da ducha quente.
Ingrid perde a noção do tempo que ficou no banheiro, mas assim que cai em si, enrola-se na toalha, decidida a não se atrasar para a sua entrevista. Precisa do emprego para sair de casa o quanto antes.
Devagar, olha para todos os lados a caminho de seu quarto. Não quer ser pega de surpresa novamente por Alexandro. E não vai mais, pois Ingrid promete a si que esta foi a última vez que seu pai a machucou.
Percebe um barulho vindo de seu quarto. À medida que caminha, Ingrid ouve outros ruídos, junto a um som mecânico intermitente.
A poucos passos da porta do quarto, Ingrid reconhece alguns dos sons: sua impressora matricial puxando o papel e imprimindo freneticamente, o som do HD do seu velho computador trabalhando, a voz de seu pai interrompida diversas vezes por um estalo seco.
– M.. pher..fia! Me...erhoa...ilha!
Esse sussurro, que se confunde com uma fervorosa oração, aumenta à medida que ela se aproxima da porta. Os estalos secos que alternavam com ele também atingiam uma altura considerável. Ingrid começa então a ficar nervosa.
Ela chega o mais próximo que sua coragem permite e ouve a voz chorosa de seu pai um pouco mais compreensiva.
– Me... Perdoa... Filha!
Ao sentir a dor nas palavras de Alexandro, Ingrid invade o quarto, num rompante e se depara com uma cena que lhe fez gritar histericamente.
Seu pai ajoelhado no meio do quarto, ao lado do computador, encharcado de sangue, batendo contra as suas costas, peitos e barriga com o cinto que usou para castigá-la. A impressora cospe as folhas no chão do quarto, encharcadas com o sangue de um homem desesperado.
– Me perdoa, filha! – diz ele, depois de cada golpe que se desfere, usando a fivela como arma. Seu olhar é o de um morto, que contempla por entre os cabelos suados e ensanguentados de sua franja a cria diante da porta, estarrecida com a grotesca cena. Não escolhe lugar para bater, levando a fivela do cinto para as costas e, com a mesma intensidade que abre as feridas, golpea-se no peito.
– O-o que v-você está fazendo, pai? – indaga a filha, desesperada.
– Me perdoa, meu neném! – disse Alexandro, entre um golpe e outro. – Eu apaguei seus e-mails, pensando que assim eu lhe daria a lição que você merecia! – e mais um golpe. – Mas quando eu terminei, a impressora começou a cuspir papel e eu havia entendido o que eu fiz! EU NÃO MEREÇO VIVER! – conclui o pai, enlouquecido, colocando o cinto em volta do pescoço e, enfiando a ponta do cinto dentro da fivela, criou assim uma forca, puxa-o com as duas mãos, empregando toda a sua força.
– PAI, NÃO! – exclama Ingrid, correndo em direção ao pai, trêmulo com a traqueia dilacerada pela compressão do cinto. A fivela atinge a jugular, fazendo descer garganta abaixo um rio de sangue.
Alexandro cede, assim, a uma morte lenta .
A mãe de Ingrid entra no quarto e vê a filha seminua ajoelhada diante do pai, chorando, cercada pelo papel da impressora que projeta para o chão do quarto os últimos metros. – Meu Deus! ALEXANDRO! – grita histericamente Nayumi, correndo para ajudar a filha.
A garota, olhando para o chão do seu quarto, ignora os gritos da mãe junto ao corpo do pai e, enxugando as lágrimas de seu rosto molhado, pega uma parte do papel impresso e sente seu coração parar ao lê-lo:
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Ingrid olha para aquela folha, que, como todas as outras encontradas no chão de seu quarto, dita a sua morte, tornando-a tão evidente quanto a de seu pai, agonizante nos trêmulos braços da mãe. Nayumi também está moribunda, pelo menos espiritualmente.
– M-mãe? – diz Ingrid, dando passos hesitantes em direção à sua pálida mãe, apavorada com tudo o que lera. – O que eu faço? O que está acontecendo, mãe?
Nayumi olha para a filha, levantando o rosto avermelhado, dando a impressão de que todo o sangue daquele corpo magro está reunido ali. As lágrimas minam de seus olhos como se toda a sua vida se esvaísse por eles.
– O que está acontecendo? – diz a mãe, fora de si. – VOCÊ é quem devia me dizer o que está acontecendo! Seu pai está morrendo! – continua Nayumi, levantando abruptamente, partindo em direção a Ingrid.
Apesar de finos, os braços de Nayumi mostram-se eficazes para segurar a filha que se debate assustada na altura dos ombros.
– Você vai me dizer o que fez com o seu pai, menina! O que você falou para ele? FALA!
Nayumi está descontrolada, capaz de matar a própria filha. Porém, a garota a empurra com força o bastante para fazê-la recuar, tropeçando no marido e caindo em cima da cama de Ingrid, atrás de Alexandro.
– SAI DAQUI! – grita Ingrid, instintivamente. – Ele que me bateu! Eu não fiz nada!
Ingrid nunca levantara a mão contra a sua mãe, mas sente que aquela é a hora de fazê-lo, pois já apanhou de seu pai e não quer que sua mãe complete o serviço.
Então o rosto de Nayumi, que se compara ao de sua filha em beleza, toma ares de ódio, evidenciando rugas e olheiras. Naquele estado bestial, olha para a filha enquanto ouve vozes que parecem vir de todo o lugar, ecoando pelo seu crânio.
– Você não presta – dita a voz para Nayumi, que repete imediatamente para a filha:
– Você não presta!
– O-quê? Mãe? – diz Ingrid, perturbada, olhando para a enlouquecida mãe.
– Você matou seu pai, vadia – sussurra a voz para a mulher.
– Você matou seu pai, vadia – repete a mãe, movimentando se na cama como uma cobra, olhando para a filha com olhos inflamados de ódio.
– Por que você está falando assim, mãe? – diz Ingrid, chorando, recuando até bater com as costas na porta do armário. Ela precisa pegar um vestido e sumir dali. Para não dar as costas à mãe, Ingrid abre a porta do espelho, podendo assim vigiar seus movimentos pelo reflexo.
Puxa do cabide o primeiro vestido que encontra, mas o que vê pelo reflexo quase faz com que o esqueça. Sua mãe a olha com um ódio demoníaco enquanto a figura de uma garota carbonizada balbucia algo em seu ouvido.
Em seguida, salivando como um cão treinado para matar, Nayumi fala para a sua cria.
– Você vai morrer!
Ingrid grita enquanto abre a porta do quarto, vendo a mãe correr em sua direção. A sede de Nayumi pela filha a faz ignorar que está pisando no pescoço de seu marido. A diminuta esperança que a blogueira tinha de salvar seu pai se perde no caminho do corredor.
A garota, que há menos de uma hora tinha uma mãe zelosa, que lhe cercava de cuidados, agora se depara com um ser diabólico em seu encalço, querendo cumprir a sentença anunciada.
Ingrid consegue ser mais rápida que a mãe, passa pela porta e a usa como escudo. Se a mulher abri-la, Ingrid sabe que estará morta.
Nayumi puxa a porta com uma força descomunal, inflada pela presença de Bruna. Por vezes chega a conseguir desencaixá-la do marco, mas graças à resistência da filha, não passa disso.
Aquela situação vai se tornando insuportável para a garota, que resolve deixá-la puxar a porta mais uma vez, sem oferecer resistência.
Conforme previu, sua mãe puxa a porta com tanta força que cai no chão.
Ingrid voa pelo corredor do segundo piso de sua casa, destinada aos quartos, descendo para o primeiro, onde ficam a sala de jantar, cozinha e a sala de estar. Corre, pulando os degraus de dois em dois, rezando para que sua mãe não a pegue. Quando termina de descer as escadas, Nayumi desponta na cabeceira dela, no segundo piso.
– Você vai morrer, vadia!
Tentando ignorar as ameaças de sua mãe e com alguns segundos de vantagem, Ingrid corre em direção à saída daquele inferno, a sua salvação, a porta da sala.
– Trancada – geme baixinho a ofegante garota, ao torcer a maçaneta.
8 comentários:
sdd do medo oculto :(
Bem feito para o pai invasivo, abusivo e violento.
Pena que ele não conseguiu se ferrar sozinho e f*deu todo mundo junto com ele.
Porra a Ingrid ia se salvar mano! Que raiva pensei que uma personagem iria conseguir salvar a pele. kkkkkkk
Agora é esperar pela semana que vem, eu tô louco pra saber o resto desse livro... Acho que vou encomendar um pra mim. u.u
Cara, que pai chato.
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Eu tambem, só soube que 66 era o numero da besta por causa do iron maiden. :P
Ixi, comentario no post errado. kkkkkkkk
Beleza que o comentário tá no post errado mas o número da besta é 666 e não 66.. São três números 6 e não dois (:
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